-Por favor sente-se. diga tudo aquilo que quiser...imagine que esta sozinha.- disse o doutor.
-Não me sinto muito bem, em falar de coisas que me são incomodas, e que mexem comigo de forma muito brutal- disse eu em tom de medo
-repare, a menina tem deitar tudo cá para fora.
Este inicio de conversa ficou marcada na minha mente até aos dias de hoje. Quem era afinal aquele senhor que pedia para eu falar de mim, assim sem nunca o ter visto antes. Na verdade foi eu que o procurei, mas não para contar tudo aquilo que tinha vivido ate ali, mas sim para ele me ajudar.
Sim eu sei, deves estar a perguntar-te como ele me puderia ajudar se não lhe conta-se a minha história, e o porque de estar ali diante, dele.
Era um senhor já dos seu 50 anos, fisicamente normal, a não ser aquela cara firme. Com barba branca, e cachimbo na boca, transmitia-me segurança. mas como pudia falar de coisas tão intimas a ele.
-sabe, isto é muito complicado.- disse eu
-não fale para mim menina, apenas fale. Se quiser feche os olhos, e desabafe.- respondeu ele.
-não é facil.- chorei.
(silencio)
-Eu tinha seis anos, quando os meus pais se separaram. Não foi facil para mim toda aquela situação, pois nunca me tinha apercebido que estavam mal a ponto de se separarem. Felizmente, souberam controlar bem toda a situação, e mesmo em relação a mim, nada tinha mudado, a não ser a ausencia da presença do meu pai em casa.
Até ai, tuda a minha infancia tinha sido normal, e posso mesmo dizer que feliz.
Passados uns anos, a minha mãe voltou a casar. Casou com um senhor bastante amavel, e sinceramente gostei muito dele, e sempre apoiei a minha mãe naquele relacionamento.
Ele tratava-me bem, e nunca me faltou com nada, era como um segundo pai que tinha.
Quando fiz 9 anos, a prenda que recebi da minha mãe e do meu padrasto, foi a noticia que iria ter um irmãozinho. Fiquei radiante.
Durante aqueles meses, tudo foi maravilhoso. Adorava enconstar a minha cabeça na barriga da minha mãe. Era linda aquela barriga. Ate que no dia 23 de março, a minha mãe foi para o hospital dar á luz. O meu padrasto estava radiante, e eu claro tambem. Estava na escola quando recebi a noticia, e foi logo a correr para o hospital. Lembro-me que nesse dia tinha discutido com a minha mãe, porque, imagine só não queria levar a saia que ela tinha escolhido para eu levar para a escola. Sai de casa mesmo zangada, e ainda me lembro de lhe ter dito no meu intimo, que a odeiava. o que era mentira. O taxi que o meu padrasto tinha dito para eu apanhar, deixou-me á porta do hospital. Corri para dentro daqueles corredores, e vi o meu padrasto sentado, com as mãos na cabeça. Gritei, então ja nasceu. Foi ai que vi o meu padrasto a chorar. pegou em mim e abraçou-me. Pedia-me desculpas, mas eu não estava a perceber nada. Comecei tambem a chorar, e ele limpando-me as lagrimas disse-me, a tua mana ja nasceu. Começei aos gritos de felicidade, e so dizia, a minha mana nasceu, a minha mana nasceu. desculpe doutor- disse eu começando a chorar.
-Não faz mal, se quer chorar, chore, não tenha vergonha- disse carinhosamente.
-Aí perguntei ao meu padrasto como se iria chamar a minha maninha, e dise-lhe que queria ver a minha mãe. Ele baixou a cabeça e disse-me que a minha mãe, agora estava no céu, a dormir com os anjos. Não percebi o que ele me estava a dizer, porque todas as noites a minha mãe me dizia para dormir com os anjos, e para mim aquilo era normal, e foi ai que respondi ao meu padrasto, que era normal ela estar a dormir, devia estar cansada, mas que queria ve-la na mesma, e queria estar ao pé dela quando acorda-se. O meu padrasto abraçou-me e disse-me baixinho, a tua mãe nao vai acordar mais, ele foi para o céu. Foi ai que me apercebi do que estava a acontecer, e afastei os braços do meu padrasto e perguntei-lhe em tom de medo, se a minha mãe tinha morrido, ele abanou a cabeça dizendo que sim. fiquei ali a olhar para ele. Lembro-me de não ter reacção. Não chorei, apenas não estava a acreditar, e repetidamente dizia ao meu padrasto que não, ela estava só a brincar, como tantas vezes fazia comigo, quando se atirava para cima da cama e gritava "morri". Sorri, e perguntei ao meu padrasto, como ele ainda não sabia dessa brincadeira. No fundo o olhar dele e todo aquele ambiente, me diziam que não era brincadeira, mas eu mesmo assim lutava contra a verdade. Mais uma vez o meu padrasto abraçou-me e pediu-me desculpa, lembro-me como se fosse hoje. Eu não estava a acreditar que a ultima coisa que tinha dito á minha mãe, era que a odeiava. Apercebi-me finalmente do que se passava, e vi que nunca mais iria abraçar a minha mãe, nunca mais a puderia beijar, e nunca mais iria ouvir aquela frase, " dorme com os anjos, meu amor". Comecei a chorar. Era pequena, mas lembro-me bem. Lembro-me que naquele dia a minha querida mãe partiu e que nunca mais iria voltar... disse eu recordando aquele olhar meigo que me deitava, quando me dizia, aquilo que hoje digo á minha pequena irmã.
"dorme com os anjos, meu amor"
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